quarta-feira, 4 de junho de 2014

Poesia da despedida...

Eu sou a minha vida

Eu bem que gostaria
De escrever essa poesia
Leve, bonitinha, amável e macia!
Agradável aos sentidos da insossa, pretensa “burguesia”!
Palatável, apreciável e vazia!

Mas o fato é que eu só tenho a oferecer esta ferida!
O fato é que eu sou a minha vida,
Por um “não” desrespeitado concebida,
Jorrada neste mundo denegrida,
Desde sempre rejeitada e ofendida!

Minha infância, de torturas recheada!
Pai ausente, mãe doente e abandonada...
Passava fome de comida e de amor, quando acordada,
E à noite, aos meus três anos, sonhava com minha mãe crucificada,
E eu, pequenina, vagava entre mortos que “dormiam” na calçada!

Não preciso de Freud a decifrar meus pesadelos!
Eu mesma me decifro e me devoro, sem modelos!
Sempre fui eu sozinha a me puxar pelos cabelos!
Do lamaçal imundo, ergui meu mundo sem apelos!
Não vou virar dondoca, cheia de regras e zelos!

Não, eu não aceito rédea alguma!
Porque eu vivi à margem, e margem sou em suma!
Eu tenho alma selvagem, não afeita a essa turma,
De gente que não sofre, que não grita, que não chora, que não espuma!
Que fala sutilmente, agride disfarçadamente, que se esquiva, que se apruma!

O sangue em minhas veias é vermelho, não azul!
Entre “céu” e “inferno” eu me situo mais ao sul!
Prefiro queimar viva a gelar no teu iglu!
Agrupa teus conselhos e os enfia no teu cu,
Porque da bosta-vida acho que sei bem mais que tu!

Eu sou sobrevivente, sou o lixo que emergiu!
Conheço abismos sujos que teu olho nunca viu!
Enquanto tu “curtias” eu “curtia” a pele ao frio!
E tenho muito orgulho da minha vila, vilã, vil,
Pois só a vila acolhe toda “puta-que-pariu”!

Enquanto a tua gente pisa em cima, se acha forte,
A nossa força nasce para vencer a própria morte!
Sou filha da miséria, e isto foi é muita sorte,
Porque a tua “elite” é uma fachada sem suporte,
Mas a minha força é minha, não depende de aporte!

Podes partir agora, também acho que já é tarde!
Melhor estar sozinha que ao lado de um covarde!
Pode ser contagioso, se alastrar, fazer alarde...
Daqui sigo meu rumo sem trair minha verdade,
Porque eu sou a minha vida, e a minha vida arde!

Jamila Saleh

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